A arte de chamar o cliente

5 Novembro, 2013

Mel do Abel_Portugalize.Me

Nos dias de hoje, é raro não sermos bombardeados por mensagens que nos tentam chamar a atenção. Há mensagens para tudo, cremes, alimentos, electrodomésticos, casas, roupa, automóveis… o marketing das marcas e espaços comerciais “queima-nos” a retina.

Na televisão, de cada vez que há um intervalo (subentende-se pausa, descanso), somos de imediato invadidos por atractivos e hipnóticos anúncios publicitários que nos levam a paciência durante uns bons 10 minutos (e a pausa transforma-se num momento de zapping aborrecido).

E os telefonemas dos bancos… das operadoras de telecomunicações? Chatos, tão chatos! “Bom dia, estou a falar com a Sra. Raquel?… sim… falo-lhe da nhó nhó e gostaria de lhe apresentar um novo produto…” A minha sensibilidade a este tipo de campanhas é nula, deixa-me furiosa e com um leve sentimento de ter sido invadida por algo que não pedi, não quero e não desejo.

Quando vou a uma loja (seja de que natureza for), gosto de estar tranquilamente a absorver o que me rodeia, de procurar o que desejo, como uma espécie de jogo do tesouro, ou de descobrir coisas novas por lá. Se alguém me aborda para me tentar vender alguma coisa repondo de forma torta.

Este é o lado chato e invasor da venda de um produto.

Há um outro lado, de maior simplicidade e veracidade na arte de cativar o cliente. A meu ver, é este lado que merece ser falado e valorizado.

Esta arte, que vive nas prateleiras do comércio familiar e tradicional, expressa-se numa cartolina escrita à mão ou numa despretensiosa conversa onde a história é mais importante do que a pressão da venda em si. “Apresentar” um produto não surge descontextualizado e do nada. A coisa flui de forma natural e é por isso que é uma arte. Ali, não há barraquinhas caídas do céu com provas de queijo flamengo do “cú de judas”, onde uma criatura com ar aborrecido quase nos força a provar aquele bocado de borracha sem nada a dizer, apenas porque é grátis ou está em promoção. Ali, há alguém que nos fala do sabor do queijo, que nos diz que liga com isto ou aquilo e nos conta uma história, como as que as nossas avós nos contavam e, sem darmos conta, estamos ligados, atentos, a aprender.

Mais do que a arte da venda, no comércio tradicional e familiar surge a arte da ligação, da relação. Nota-se o gosto genuíno pelo produto, e é esse gosto, esse amor que é passado.

O Mel do Abel até pode nem fazer nada à pele, mas aquele mote prende, paramos diante dele pela graça e pela curiosidade de saber se foi mesmo o Abel que fez o mel. Depois vem a Dona Fátima ou o Sr. Alcides (o artista da rima lá do supermercado) e falam do mel, do Abel, da Quinta Nova, das Encostas do Côa

E o mel não é só mel, não é apenas um produto, é uma história, são pessoas, lugares.

(Imagem e Texto: Raquel Félix/ Portugalize.Me)