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Uma paixão

11 Junho, 2012

(Sagres num supermercado panamenho)

Português que é português vive o futebol de cachecol ao pescoço, mesmo com estas temperaturas tropicais. Procura tremoço por tudo quanto é loja gourmet e, se tiver sorte, encontra cerveja Sagres no supermercado. Vive assim, à distância, um momento de paixão nacional que parece só o futebol conseguir dar.

Já notaram como somos tão portugueses, sobretudo quando a selecção ganha? Quando a selecção joga bem, mas infelizmente perde, também temos algum entusiasmo a descrever o bem que passaram a bola e quão injusto foi o resultado. Mas quando a selecção joga menos bem – ou mal, mesmo – todos temos uma crítica, somos todos treinadores de alto gabarito e nem falar na nossa capacidade técnica. A selecção é crucificada, ao treinador pede-se-lhe a cabeça, enfim, uma desgraceira mediática que inunda a realidade durante umas fugazes semanas e depois – puf! – desaparece.

Honestamente, o tempo de antena dedicado ao futebol masculino, comparado com qualquer uma das várias modalidades (ou praticantes) em que o nosso país dá cartas, é completamente desproporcionado relativamente aos resultados que a selecção entrega. Contudo, o tom em que estas notícias são dadas são um excelente barómetro da mentalidade dominante.

Esta nossa parcialidade, apesar de praticamente inócua no futebol, não o é noutros campos. Esta nossa parcialidade, noutras circunstâncias, chama-se “inveja” e é o que nos faz olhar para o êxito alheio e sugerir que “teve sorte” (se for um homem) ou “subiu na horizontal” (se for uma mulher).

A inveja faz-nos obviar o mérito que tem quem tem uma ideia, trabalha para a pôr em prática, mobiliza-se a si e à sua equipa e que, ao partilhar os seus resultados com o mundo, “se está a gabar”.

Uma coisa que aprendi nestes meus anos latino-americanos, sobretudo nos anos passados na Argentina, é que os cidadãos têm um estado que faz muito pouco por eles. Mesmo assim, a vida continua e o que importa é continuar a lutar, a criar o seu próprio emprego, arriscar e avançar. Foi assim que nos anos após a crise de 2001 Buenos Aires se tornou uma cidade vibrante, cheia de museus, galerias, espectáculos de rua, revistas culturais, restaurantes e cafés.

E é esta a atitude que necessitamos para vencer esta crise – e de caminho, esta “eurocopa”: temos de lutar e trabalhar apesar do governo, da austeridade e das dificuldades. Na imagem futebolística, a selecção terá de lutar e trabalhar para vencer, apesar de todas as dificuldades.

No fundo, temos de nos voltar a apaixonar por este nosso país, que é mais do que um punhado de números. Há um país para além da crise, há mais trabalho que emprego e há muito mais que ler que as notícias apocalípticas que nos inundam os dias.

E… Força Portugal!

(Texto e imagem: Ana Isabel Ramos)